quinta-feira, 17 de maio de 2007

JRS 632 CODEX

Hoje quero falar de O CODEX 632, de José Rodrigues dos Santos. Confesso que hesitei antes de: o romance tem um título bué de tramado. Não tanto por causa do 632, já que é um número prodigiosamente divisível pelo primo 79, o que o torna francamente mais interessante que tentar perceber porque há hoje tanta gente a querer ser presidente da CML. A coisa está mais no códex. É que códex rima com coisas tão modernaças quanto soporíferas como sejam o Simplex, os duplex, os próprios colchões Colunex, e ainda com o googolplex, que é um 10 seguido de um googol de zeros, um número tão grande, tão grande, que há quem arrisque ser ainda maior que a fila de trânsito no IC19 em hora de ponta. Enfim, nada de muito excitantex.

Todavia, parece que códex foge a esta geração. O códex, invenção da civilização romana, melhorou de facto o mundo. Como vós provavelmente sabereis – eu não sabia, mas tenho desculpa, que sou informático – códices são os objectos que substituíram aqueles rolos de manuscrito enrolados à volta de um pau que um lente, para conseguir divisar, tinha que ir desenroscando e desenroscando e desenroscando, enquanto rogava pragas por ninguém ter ainda engendrado algo de mais prático. Ou seja, códices não são mais que livros a sério, fisicamente organizados em folhas protegidas por uma capa, lombada com título, código de barras, e referência do ISBN (acho que estas últimas inovações não remontam aos romanos, mas isso agora não interessa).

Então porque se chama O CODEX 632 o romance de JRS? Não digo, não faltava mais nada que começar a contar por aqui a história. Eu só estive a falar no assunto para entreter e encher linhas. Mas posso adiantar que se trata de um romance de espionagem, em que o 007 de serviço está às ordens de sua majestade, D. João II. Todavia não tirem conclusões precipitadas: o herói do romance não é o nosso agente secreto, mas um professor na Nova de Lisboa. Porquê? Não vou explicar, leiam o romance se quiserem. Ah, e também entra uma sueca, loura e bem servida de seios. O que é que ela faz? Bom... não estavam à espera que eu vos contasse aqui, pois não?

Eu li com agrado o CODEX por três motivos. Primeiro, porque além de façanha de espiões, o 632 é um bom romance histórico. Partindo de investigações controversas (v.g., de Mascarenhas Barreto), vê-se que JRS queimou as pestanas na matéria, tecendo uma bela intriga que não intruja onde não é de bem que um romance especulativo intruje: antes fantasia honesta, alegre e livremente a partir de factos e documentos, ao invés de verter iluminices a partir de mentirolas e artistices. Não é o CÓDIGO DA VINCI, portanto.

Segundo, porque é um livro de aventuras que dispensa grandes explosões, assassínios em massa, e salvamentos de donzelas das bocarras de talibãs opus-deiónicos com superpoderes malignos e uma cicatriz na testa do tamanho do novo aeroporto da OTA. Ah! E nenhum personagem é descendente em linha directa de Jesus Cristo e Maria Madalena. Dizia, portanto, que não é o CÓDIGO DA VINCI. De todo.

E terceiro – e sobretudo, para mim, este terceiro – porque JRS sabe escrever páginas e páginas de longos diálogos que dá gozo ler. Não pela naturalidade, humor, feição, forma, sentido da vida, segredo profundo do universo, última palavra de Deus, qual o próximo programa da TVI em que vão entrar jet-setes, etc., mas tão só porque são boas conversas de expor argumentos. Assim com se fossem entrevistas com pessoas com algo a dizer, mas em que nem entrevistador nem entrevistado estivessem preocupados com ao raio da posição da câmara ou do botão do gravador. Apenas isto, mas é fixe. Ou lixado… para quem goste do CÓDIGO DA VINCI.

E para concluir, adianto que a trama de O CODEX 632 descreve um círculo. E bem redondinho, por acaso! Agora, claro que não vou explicar o que quero dizer com isto. Se quiserem saber – é fácil – leiam o romance.

sexta-feira, 11 de maio de 2007

A Vida em som

Os pequenos momentos que, sós ou partilhando, nos fazem "voar" para outros Universos são a verdadeira fonte da eterna Juventude.

A Arte, sob todas as suas formas de expressão, é o navio que nos leva entre os portos da Vida pelo mar encapelado da vidinha.

E se a Literatura e a Pintura nos têm preenchido belos momentos, esta semana o Espaço XXI7 vem trazer a Música ao 1S1O.

E não em momentos de ocupação rotineira como música de "fundo" mas com o objectivo de fruição plena, proponho para esta semana dois momentos de descanso físico, um em cada dia do fim de semana, que recuperem o espírito do desgaste das tarefas quotidianas.

Sem qualquer critério de ordem começo por um dos meus temas de Vida: Concerto Nº. 1 para piano e orquestra de Tchaikovsky.

Sintam como o piano nos conta a maravilhosa aventura da Vida, com os seus momentos altos e baixos mas sempre a valer a pena. Para os amantes da observação de aves recomendo que fechem os olhos e vejam como a mais bela ave percorre todos os nossos Universos.
Vou ouvir a interpretação do pianista Lang-Lang.

Mas a Vida também pode ser cantada e Georges Bizet fê-lo através da sua Carmen.

As relações humanas estão bem retratadas nesta obra e a música nem sei como classificar; Apenas sei que gosto. Da última vez ouvi a obra completa várias vezes.

Ouçam, fruam, vivam e façam favor de ser felizes.

segunda-feira, 7 de maio de 2007

Irredutíveis

O 1S1O já vai na terceira semana e eu ainda não sugeri coisa alguma. Nem percebo como é que o Espaço XXI 7 não começa por aqui a vociferar e a marcar faltas! Bom, esta marmelada tem de acabar e é já!

Pois bem, gostaria de vos sugerir dois espectáculos iluminado pela melhor isenção que consigo imaginar: não vi nenhum deles, não sou amigo de gente de lá, não são do meu bairro, não faço a menor ideia se prestam, e nem sei o preço dos bilhetes. Sugiro-os apenas porque são criações de irredutíveis. Irredutíveis que, como explicam os pacientes dicionários, pertencem à raça do que não se pode reduzir, não se pode simplificar, não se pode aplacar, não se pode converter, não se pode vencer. Gente do caraças, portanto. Falo da
«Variação sobre a Última Gravação de Krapp», pela Casa Conveniente, e do «Já Viram Isto?», pelo
Teatro Maria Vitória.

Sofro da vulgaridade de ter uma paixão pelo teatro, mas a
Revista deixa-me indiferente. Pior que indiferente, deixa-me idiota. Aquilo é para ter piada e eu não consigo perceber onde está a suposta dita. Vejo-me numa sala inteira que se ri a bandeiras despregadas enquanto decorre uma incompreensível cena entre uma varina e um chui, e os meus olhos procuram pelo raio do televisor onde devem estar a passar o episódio do Mr. Bean que justifique toda aquela galhofa. Evito o Teatro de Revista com a mesma determinação que evito discussões em torno do pós-modernismo: são temas que me ultrapassam e desconfio predisponham ao herpes labial. Todavia tenho um fraquinho pelo Maria Vitória, confesso. Porque.

Porque o Maria Vitória fica no Parque Mayer, um local de Lisboa excelentemente dedicado à falsidade política, à especulação sobre dinheiros públicos e à caca dos pombos. Em tempos albergou quatro teatros vivos: além do Maria, o Variedades, o ABC e o
Capitólio, este último obra-prima do modernismo português e do Arq. Cristino da Silva, hoje transformado num destroço, num monumento à falta de vergonha da minha cidade. Só o Maria se conserva vitorioso a mostrar Revista. Quem entre no nojo em que está hoje o Parque Mayer compreenderá o valor de quem consegue ali manter um teatro comercial a funcionar. Com certeza, só gente extraordinária conseguirá tal feito. E gente dessa merece respeito. E mais que respeito, merece plateias cheias. Plateias mesmo muito cheias, que diacho!

Já a Casa Conveniente é um pequeno teatro localizado no Cais do Sodré, enfiado entre os melhores bares do disto e daquilo de Lisboa – pelo menos a fazer fé na opinião do rum mais experiente: o exalado pela excelência do arroto sabido dos marinheiro que aportam à capital. Mas, esquecendo os bares, o que se representa na Casa Conveniente? Assim de repente lembro-me de Fassbinder, Tchekov, Rimbaud, Handke, Heiner Müller, creio, Beckett, ah, e agora Beckett outra vez. A sua directora – a Sra.
Mónica Calle – não faz a festa por menos. Embora...

Embora não seja fácil ver-se teatro na Casa Conveniente. Quase sempre se fica com dores nas costas, que a ideia de fornecer conforto aos espectadores é um exclusivo da concorrência dos bares vizinhos.
Por vezes partem-se uma lâmpadas e há uns estilhaços a voar; também já vi caírem móveis de metal em cima de espectadores; e num curioso espectáculo aq
ui há tempos, o público participava em actividades de construção civil – este vosso, por exemplo, viu-se uma vez a percorrer a noite de meio Cais do Sodré com um saco de cimento na mão, ou de areia, já nem sei bem. Mas tudo isto é compreensível dada a composição quase sempre exclusivamente feminina da companhia – estivesse aquilo na mão de homens e por certo outra delicadeza seria oferecida às actividades.

Chega! Creio haver-vos convencido que Maria Vitória e Casa Conveniente pertencem à nobre espécie dos irredutíveis. Agora, convencer-vos a entrar em casa de indomáveis, isso não pretendo. Pode ser perigoso. Se calhar nem vos devia ter sugerido tal coisa... Olha, o melhor é não irem ver nada disto, OK? Esqueçam as minhas sugestões. Há por aí muito D. Maria II e assim. Ai, ai, por favor, tenham-me lá juízo!


(Fotografia do topo extraída do sítio da Casa Conveniente. Imagem de baixo, cartaz da Revista em cena no Maria Vitória).

quinta-feira, 3 de maio de 2007

O Muro

Um dia construíram um muro. Era alto, imponente, cinzento. No muro alto, nem um pequeno tijolo de sol - apenas a arrogância fria do cimento. As pessoas olhavam o muro alto e não imaginavam o que poderia estar do outro lado. É que o muro alto era também muito largo – tão largo que não se lhe conhecia o fim.

Na história do muro alto estavam inúmeros muros, de diferentes tamanhos e consistências, entremeando com arames farpados e vidros partidos. Para quem os olha sem saber o que está do outro lado, os muros altos parecem crescer todos os dias um pouco mais. De tanto crescerem, os pequenos muros tornaram-se apenas um - um imenso muro alto e consistente.

Um dia pintaram caras no muro. Seriam, talvez, caras do lado de lá… pois se há gente deste lado, do outro também deve haver. Será que, do lado de lá, também pintaram caras? Será que pintaram as caras do lado de cá? Estaremos, assim, a ver-nos uns aos outros nas imagens paradas cravadas no muro frio? Quem és tu, meu irmão, que me olhas sem rancor (mas com ironia)? Não, juro que não tenho culpa, não tenho nada a ver com esta parede monstruosa que me limita o horizonte. Terás tu algo a ver com o muro alto, ou, quem sabe, terás talvez algo a ver com as imensas fotos que estamparam no muro a sua própria vergonha?

Já nem me lembro se do outro lado corria um rio ou verdejava uma floresta… O mais certo é crescerem casas, como aqui, casas com tecto e 4 pequenos muros, todos com um lado de dentro e um lado de fora. E nós, estaremos do lado de dentro ou do lado de fora do muro alto? De que lado fica a prisão ou a liberdade? Estaremos livres ou, com maior probabilidade, apenas perdidos? Estaremos seguros ou, quem sabe, apenas presos? Ou será que a terra acaba com um enorme abismo do outro lado do muro alto…

Bring down the Wall !

http://www.euronews.net/index.php?page=info&article=418352&lng=6
Imagem: anúncio da TBWA/Paris para a Amnistia Internacional